Engraçado foi a forma como soube disso. Estou eu, chegando um tanto quanto esbaforida depois de uma sessão arrepiante de ônibus lotado, suarento e esmagante, quando dou com minha mãe sentada no sofá, aparentemente recém-chegada do trabalho, assistindo à TV, mais exatamente à emissora Globo. – Tás vendo, Amanda? Chamaram a menina de puta por que ela foi de vestido curto para a faculdade. Eu bem que te digo! Claro que prontamente achei um absurdo. Um julgamento embasado apenas na vestimenta de alguém não tem propriedade nenhuma. Mas também não levei muito a sério, principalmente levando em conta a credibilidade da fonte informante, visivelmente uma pessoa que está sempre procurando novos exemplos no mundo e, quiçá, no universo, que eu estou errada e ela certa. Então esperei o domingo para formar qualquer opinião sobre o assunto e, assim que ouvi a chamada do Fantástico pro, num eufemismo aberrante, babado quentíssimo, saí correndo do quarto e sentei no sofá, de frente pra televisão, cruzando as pernas na posição de lótus e apertando meu dedão do pé de ansiedade. Claro que minha mãe me xingou por estar naquela posição e por ficar mexendo nos dedos dos pés, mas como a minha mãe não precisa de razão certa para me xingar, ignorei e voltei minha atenção totalmente para TV, abanando a mão para ela se calar, coisa que ela odeia.
A princípio, foi o choque. No meu íntimo, eu realmente não acreditava que fosse 100% verdade. Eu imaginava uma história mais cabeluda, envolvendo sex, drugs, rock and roll and a short, sexy and red dress. Mas no fim, não. Tudo o que a menina fez, a príncipio, foi ir assistir aula com um vestido um tanto quanto pequeno. Foi difícil de entender o episódio. Na verdade, eu ainda não entendi mesmo. Eu mesma sou adepta de roupas curtas e muitas amigas minhas também e, sim, muitas vezes vamos para a faculdade com aqueles shortinhos xadrezes que estão tão na moda e que, sim, são curtos! E ninguém jamais teve a audácia de dizer que somos putas. Não creio que essa idéia sequer tenha passado pela cabeça dos meus colegas. Simplesmente por que é tão retrógrado, visto os avanços da moda e do relativismo sobre o que é certo e errado no vestir. É tão machista, tão psicótico, tão dinossáurico. É em momentos assim que percebemos que não avançamos tudo o que temos para avançar, em questões de direitos iguais para ambos os sexos. Por que se um cara chegar sem camisa na faculdade, ninguém vai sair gritando que ele é garoto de programa. E eu não creio que a tal Geisy pague menos do que qualquer outro aluno da Uniban. O pior é que as pessoas como minha mãe, que parecem viver em outra era geológica, agem como se fosse culpa dela, mesmo. – Quem mandou ir de vestido curto? Eu acho é pouco! WTFP das pessoas em respeitar umas às outras? Espero que quem advoga utilizando esse tipo de argumento saiba que ele descende do mesmo que diz que “se a mulher provocou – usar roupas curtas é entendido como provocação -, o estupro não é exatamente um crime”. E não poderia haver afirmação mais imbecil, na falta de uma palavra que exprima toda a desolação do pensamento curto. Atitudes como a da Uniban já deveriam ter sido totalmente banidas. É um absurdo, uma vergonha, que hoje em dia o tipo de mulher que somos ainda seja totalmente julgado pelo tipo de roupa que vestimos. E que, além de julgar, as pessoas ainda se achem prontas para fazerem papéis de algozes dos seres humanos que decidirem usar uma minisaia, ou um minivestido. Aparentemente, as pessoas, ao invés de aprenderem que ninguém é perfeito de uma vez por todas e, exatamente por isso, não cabe a ninguém julgar ninguém, estão fazendo a história seguir num ciclo vicioso que leva sempre ao mesmo limbo de estreitismo de mente do qual eu, particularmente, já estou cheia. Então, digam oi para a Idade Média, de novo!
Pauta para o TDB, sobre o caso UNIBAN.